14 de fevereiro de 2011

O Mal

O céu estava azul, azul estrelado, se é que vocês conseguem entender o que eu quero dizer com isso. Um azul tão forte que não parecia ser apenas o céu, parecia que algo além do céu estava ao alcance dos nossos olhos aquele dia. Foi o dia mais belo de toda minha vida, minha longa vida.

Eu tinha acabado de completar mil cento e quatorze anos, já tinha visto muitas coisas extraordinárias, coisas que não compreendi e coisas que me maravilharam, já tinha passado pelas Regências de todos os Três-que-são-um, quem regia Pilar-do-Norte agora era M'Eraag, tinha até visto O Trovejante bem de perto, mas nada havia me preparado pra o que eu iria ver naquele dia.

Foi quando soaram as trombetas. O toque triplo indicava perigo real, e não só treinamento. Indicava que Pilar estava diante de grande perigo, e era hora de uma batalha como as que meu avô travou.

Tentei me compor o mais rápido possível, era um soldado, havia sido treinado pra coisas assim, mas nunca havia realmente enfrentado o perigo, somente situações controladas e bandidos comuns. Aquilo era minha grande chance de entrar pro rol dos heróis. Me pus de pé e me preparei pra a batalha.

Olhei o fio de minha espada, estava afiada o suficiente pra cortar o braço de um homem adulto.

Contei minhas flechas, eram quarenta e cinto, com ponta de mitral em com serras dos lados. Letais. Eu conseguia acertar uma maçã a cinquenta metros, e a vinte conseguia matar um javali com um tiro. Quarenta e cinco me pareceu até exagero, nada podia sobreviver a uma saraivada de cem arqueiros que conseguem atirar duas flechas antes da primeira atingir o alvo.

Minha lança já estava em punho, longa haste de cedro com núcleo de olmo, resistência o bastante pra perfurar o peito de um homem, e flexibilidade pra não quebrar se encontrar uma maior resistência, como de uma boa armadura.

Armas a postos, só faltava afivelar as botas e o colete de minha armadura. Tinha herdado ela de meu pai, uma cota mitral dos anões sob um peitoral de adamante. O elmo era de aço escovado, típico elmo da guarda, bem sólido, e eu o incrementara com mais algumas coisas, uma viseira de bronze, um alcochoamento de linho, e uma proteção extra de cota de mitral. A cota já havia me salvado uma vez, quando uma flecha acertou meu pescoço.

Estava pronto pra batalha, ou pelo menos achava que estava. As trombetas soaram, a infantaria não tardou a entrar em formação, e eu fiz questão de estar na linha de frente, se fosse bem nessa batalha, conquistaria respeito e fama o bastante pra comandar minha própria formação de batalha, de ter meu próprio símbolo pintado nos escudos de meus soldados.

Isso pode parecer irrelevante pra vocês, mas eu queria ilustrar o sentimento de invencibilidade que permeava nossas mentes naquela manhã azul. Pilar nunca havia sofrido uma derrota em batalha, todos os contos falavam de conquistas gloriosas, de épicos embates que levaram nossa cidade a glória, riqueza e poder.

E foi assim que partimos. Quatro mil e quinhentos soldados de elite, todos elfos, todos, assim como eu, com mais de trezentos anos de treinamento. Nada poderia nos ameaçar. Não naquele dia azul. A trombeta soou mais uma vez. Hora de avançar.

...

Primeiro veio o urro. Um único urro, se é que se pode chamar aquilo de urro. Um grito. Não, vários gritos. Era como se alguém estivesse morrendo várias vezes... ou como se várias pessoas estivessem morrendo ao mesmo tempo, em agonia excruciante. Mas era um único ser. Com os gritos de pessoas ouviam-se também estalos e o que eu só posso descrever como uma espada cega cortando madeira molhada. Por fim, misturado a tudo isso, o grosso e furioso som de um trovão. Se você conseguiu imaginar tudo isso, você está perto do que foi aquele barulho, mas apenas perto, por que não há como descrever o calafrio que veio percorrendo minhas veias até chegar a minha cabeça, que me fez largar minha lança e chorar, apenas chorar de desespero. Era como se eu tivesse acabado de ver todos os meus entes amados morrerem, como se tudo que eu fiz na vida tivesse sido arrancado de mim, e se eu fosse o próximo a morrer, e fazer parte daquele urro. Era esse o tipo de desespero que vinha com o ribombar daquele maldito rugido. Assim que posso descrever o urro, como o som do desespero.

O urro foi seguido por um tremor, um leve tremor, o bastante pra me despertar do transe de desespero, e olhar pra frente. Desejei não ter olhado... Havia dezenas de corpos pelo chão, um dos meus companheiros de pelotão estava parado apoiado em sua lança, com um olhar fixo em direção ao sul. Havia morrido. Seus olhos estavam vermelhos e esbugalhados, os lábios ensangüentados por sua própria mordida, as mãos apertavam a lança com a força do rigor mortis, e estava tão branco que mais parecia um fantasma. O coitado havia morrido de medo. Nada podia ser feito, devíamos seguira adiante, as cerimônias e ritos seriam executadas depois, e os médicos cuidariam dos cadáveres.

Em seguida veio o fedor, fedor de carniça, de podridão e de morte. Era intenso, Intenso ao ponto de me dar náuseas. Alguns companheiros vomitaram, outros desmaiaram, mas assim como os mortos eles ficariam pra trás, a formação não podia ser desfeita. A cavalaria já estava a postos, e o trabalho da infantaria é chegar antes e abrir espaço pra que os cavaleiros façam a matança. Avançamos.

Quanto mais me aproximava do lugar, mais aumentava o medo dentro de mim. Já tremia e suava, e lutava com minhas vísceras pra mantê-las quietas e não por pra fora a refeição da manhã. O fedor aumentava, o calor começava a despontar, minha armadura parecia mais pesada. Estava cansado, mas não tanto quanto outros, que já caiam exaustos. Aquilo não podia ser normal, em conta rápida vi que pelo menos um sétimo do exercito havia ficado pra trás, entre mortos, doentes e cansados. E de repente, tudo ficou escuro.

Não sei como descrever a criatura que se levantava a quase um quilometro de distancia. Primeiro por que jamais havia visto algo como aquilo. Segundo por que, confesso, senti tanto medo que desmaiei por algum tempo. Mas vou contar o que vi e o que aconteceu antes de meu desmaio. A criatura era imensa, a julgar pela sombra e pelo ângulo do sol que ainda não estava em seu apogeu, deveria ter duas centenas de metros de altura, curvado. Tinha um casco espinhento recobrindo as costas até a metade da calda. As maciças pernas traseiras eram desproporcionais, longas e fortes, como as dos répteis. Tinha um par de chifres, do tamanho das maiores construções que eu conhecia. A cabeça compacta tinha pequenos olhos malignos acima da bocarra, que agora rugia de novo. Foi nesse rugido que apaguei, mas não antes de ver... de ver a atrocidade. O vento que saiu da garganta dela era quente demais. Senti bolhas surgirem na minha pele por baixo da placa de aço em meu peito, senti a viseira de bronze se derreter e me cegar o olho esquerdo, antes que fosse arrancada junto com o elmo. Preço que hoje acho pequeno, se comparado ao destino de outros. O vento forte que me arrancou o elmo, e não fosse minha cota por baixo, teria feito estragos piores, arrancou, pedaço a pedaço, a pele de muitos de meus amigos. Os que estavam mais perto tiveram pior sorte, ou melhor, dependendo de como se olhar. Alguns foram incinerados rapidamente, outros esmagados por companheiros arrastados pelo ar, tão rápido que o choque entre o bólido de armadura e o pobre alvo fazia com que os dois explodissem dentro de suas proteções metálicas. Os de nós que tinham sobrevivido se preparavam pra retirada, toda a cavalaria já tinha fugido, nenhum cavalo conseguiu ficar diante do horror, e foi nessa hora, na retirada, que eu desmaiei. Minha ultima visão foi o céu azul embaçado pelo sangue de meu rosto, sendo cortado por vultos brancos reluzentes, de várias formas e tamanhos. Eu não os vi por completo, mas sabia, sabia que os Paladinos estavam voando em direção a criatura, e, graças aos deuses, estávamos salvos...

Aos jogadores...

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